História

O Alto Douro, no nordeste de Portugal, é uma das grandes e históricas regiões vinícolas do mundo.

A videira tem aí crescido desde a antiguidade e sabe-se que os romanos faziam vinho nas margens íngremes do rio Douro ao longo da sua longa ocupação da Península Ibérica. Mais tarde, após a ordenação formação do Reino de Portugal no século XII, o país tornou-se um importante exportador de vinho. No entanto, só em meados do século XVII, é que a região do Douro se tornou a fonte do que conhecemos hoje como vinho do Porto.

Foi o Tratado de Windsor, assinado por entre Inglaterra e Portugal em 1386, que lançou as sementes para o surgimento deste grande vinho clássico e a transformação da região do Douro numa das mais consideradas regiões vinícolas do mundo. O tratado estabeleceu uma aliança estreita e uma forte relação comercial entre os dois países. Muitos comerciantes ingleses estabeleceram-se em Portugal, onde o tratado lhes tinha concedido privilégios especiais e, no final do século XV, os embarques de vinho português para a Inglaterra tornaram-se substanciais. Em 1654, um novo acordo comercial criou condições ainda mais favoráveis para os comerciantes ingleses e escoceses que vivessem em Portugal, muitos dos quais tinham as suas casas na cidade portuária do norte, Viana do Castelo, ou na cidade vizinha de Monção. De Inglaterra trouxeram bacalhau, bem como lã e algodão. Em troca, exportavam produtos portugueses do setor agrícola, incluindo o vinho fino delgado e adstringente da zona costeira do Minho, conhecido como "Tinto de Portugal".

Fonseca Porto
Fonseca Porto

Duas décadas mais tarde, o comércio de vinho português recebeu um novo incentivo. Um bloqueio da exportação importação de mercadorias inglesas para a França, imposta em 1667 pelo seu primeiro-ministro Colbert, fez com que o monarca inglês Charles II retaliasse, proibindo a importação de vinho francês. O setor do comércio inglês de vinho foi forçado a procurar outro lugar para o seu abastecimento. Os comerciantes ingleses de Viana do Castelo aproveitaram esta oportunidade. No entanto, logo descobriram que os vinhos ásperos do Minho não se adequavam ao paladar inglês e começaram a procurar mais para o interior os vinhos que pudessem agradar mais ao consumidor.

Foi nas montanhas remotas do Alto Douro que encontraram o que procuravam. Protegido pelas montanhas dos ventos húmidos que sopram do oeste do Atlântico e que trazem chuva para as vinhas costeiras do Minho, o Douro com o seu calor de verão escaldante e clima árido produzia os vinhos robustos e inebriantes que o mercado queria. No entanto, os comerciantes ingleses eram incapazes de transportar por terra o vinho do Douro para Viana do Castelo. A única maneira que este poderia ser transportado para a costa era de barco, pelo rio Douro. Um por um, os comerciantes ingleses deixaram Viana e estabeleceram os seus negócios na grande cidade mercantil do Porto, a poucos quilómetros da foz do rio. Em 1710, a maioria tinha já aberto as suas caves em Vila Nova de Gaia, na margem sul do Douro, em frente ao antigo centro da cidade do Porto, onde permanecem até hoje.

Este poderoso vinho da região do Douro recebeu o seu nome a partir do local de onde era exportado, a cidade do Porto. O mais antigo registo conhecido de vinho exportado sob este nome data de 1678.

Naquela época, o vinho do Porto não era o rico vinho fortificado que conhecemos hoje. A maior parte era seco, embora uma pequena quantidade de aguardente vínica fosse frequentemente adicionada antes do transporte para garantir que este vinho permanecesse em boas condições até chegar à mesa do consumidor.

No século XVIII as vendas de vinho do Porto cresceram rapidamente à medida que o vinho vermelho e rico do Douro ganhou popularidade. O Tratado de Methuen de 1703 incentivara o comércio de vinho do Porto definindo uma taxa de imposto inglês muito menor para o vinho português do que para os vinhos franceses. A forte demanda procura de vinho do Porto trouxe grande prosperidade para a região do Douro, bem como aos comerciantes ingleses. No entanto, à medida que o tempo passou, também se encorajou esta forte procura, o que acabou por estimular a especulação e a fraude. Particularmente quando os embarques de vinho do Porto caíram acentuadamente na década de 1750, a especulação e a fraude já estavam bastante disseminadas.

Em 1756, o primeiro-ministro de Portugal, o poderoso e influente Marquês de Pombal, introduziu uma série de reformas draconianas. Nomeadamente, impôs um monopólio estatal sobre a venda de vinho do Porto, sobre e a sua exportação para a Inglaterra e Brasil, bem como sobre a produção de aguardente usada na fortificação. Este definiu os limites da área de vinha do vinho do Porto, marcando-os com mais de 300 postes de pedra conhecidos como os "marcos pombalinos". Em 1757, realizou a primeira classificação detalhada das vinhas do Douro, classificando-as de acordo com a qualidade e estabelecendo preços para a sua produção. Os melhores vinhos foram designados como "vinhos de feitoria" e estes podiam ser enviados para o exigente mercado inglês, enquanto os de menor qualidade, apelidados de "vinhos de ramo", só poderiam ser vendidos em Portugal. Foram tomadas medidas para acabar com as práticas fraudulentas que se tinham tornado comuns, tais como a adição de sumo de sabugueiro para dar cor e aparência de qualidade a vinhos pobres.

Estas reformas visionárias efetivamente determinaram o vinho do Porto como a primeira denominação de origem controlada do mundo. Embora inicialmente impopulares entre os produtores e comerciantes, que se ressentiam da maneira arrogante com que por vezes foram levadas à prática, estas medidas anunciaram uma nova era de crescimento e riqueza. A crescente importância do rico mercado brasileiro contribuiu para essa prosperidade.

Fonseca Porto

Em 1791 os limites a leste do rio Douro foram abertos à navegação quando as enormes rochas que obstruíam o cachão da Valeira foram finalmente retiradas. Isso tornou economicamente viável plantar vinhas na área oriental do Douro, que se tornou conhecido como o Douro Novo e mais tarde como Douro Superior. Nos anos que se seguiram, muitas novas propriedades nesta área foram adquiridas e transformadas, incluindo algumas famosas propriedades cujos magníficos vinhos muito fizeram para aumentar o prestígio do vinho do Porto.

Ao longo dos séculos XVII e XIX, e até meados do século XX, a tarefa de transportar os novos vinhos a jusante do rio para as caves dos comerciantes de vinho do Porto em Vila Nova de Gaia era encetada pelos "barcos rabelos" ". Estes notáveis barcos fluviais de fundo chato, com os seus característicos longos remos de direção e largas velas, foram projetados para transportar cargas pesadas de barris de vinho do Porto pela forte corrente do Douro através dos mortíferos rápidos, das traiçoeiras rochas e dos estreitos desfiladeiros.

Foi na segunda metade do século XVIII que a técnica de fortificação, tal como é praticada hoje em dia, se tornou paulatinamente generalizada. Nos primeiros dias do comércio do vinho do Porto, era prática comum adicionar uma pequena quantidade de brandy aguardente vínica ao vinho antes do embarque para conservá-lo. No entanto, no final do século XVIII, tornou-se cada vez mais comum a adição de um pouco de aguardente vínica - essencialmente, uma jovem e clara aguardente neutra destilada de vinho -- não antes do embarque, mas sim durante a fermentação, parando-a antes que toda a doçura natural do sumo da uva tivesse sido convertida em álcool. Isso garantia que o vinho nunca se estragaria e, mais importante ainda, criava um vinho cuja doçura, a força e riqueza de sabor era muito do agrado quer do consumidor inglês quer do consumidor oriundo de outros países. Só por volta de 1850 é que este método de fortificação foi universalmente adotado como uma componente essencial do processo de produção vinho do Porto, tendo-se tornado prática comum no final do século XVIII.

No final do século XVIII também ocorreu um outro desenvolvimento crucial, ou seja, uma mudança gradual na forma da garrafa de vidro. Em vez de ser alargada, em forma de cebola e destinada a ser reutilizada, a garrafa tornou-se progressivamente mais alta, mais cilíndrica e barata de produzir. Na década de 1770 a sua forma permitiu que fosse-lhe ser armazenada de lado e utilizada para o envelhecimento do vinho a longo prazo do vinho. A adoção da fortificação, que aumentou a capacidade de idade do vinho do Porto, combinada com o desenvolvimento da garrafa cilíndrica, levou ao surgimento do mais nobre de todos os estilos de vinho do Porto, o vinho do Porto Vintage. Pensa-se que o primeiro vinho do Porto Vintage tenha sido produzido em 1775.

O início do século XIX foi marcado por conflitos. As campanhas peninsulares de Napoleão e a guerra civil entre os partidários dos pretendentes liberais e dos pretendentes absolutistas ao trono português, afetaram os embarques portuários. No entanto, o retorno da paz em 1830 deu início a uma era de ouro para os produtores de vinho do Porto. A valorização do vinho do Porto começou-se a estender para além dos seus mercados tradicionais na Grã-Bretanha e no Brasil. Países como a Rússia, Alemanha, Holanda, Escandinávia e os Estados Unidos também começaram a se interessar pelos magníficos vinhos da região do Douro.

À medida que o século avançava, o vinho do Porto Vintage consolidou o seu prestígio como um grande vinho, pelo menos, tão respeitado e desejado como os outros famosos vinhos da Europa. Com o lançamento do Vintage de 1840, a Fonseca adquiriu uma reputação pela qualidade dos seus vinhos do Porto Vintage. O costume de lançar vinhos do Porto Vintage apenas nos melhores anos, ou por outras palavras, "declarando" apenas as melhores vindimas, emergiu nesta época, assim como o gosto por vinhos que tinham envelhecido durante algum tempo em cave.

As décadas de 1860 e 70 trouxeram a desgraça para a região do Douro, na forma da filoxera, esse mortal pulgão da vinha norte-americana que já havia devastado muitos dos vinhedos da França, atacando e destruindo as raízes das videiras. Pensa-se que a filoxera chegou ao Douro em 1868. Em qualquer caso, no início da década de 1870 tinha destruído muitos dos melhores vinhedos durienses. A filoxera foi finalmente controlada por enxertia nas castas portuguesas das resistentes raízes nativas das videiras americanas, mas no entretanto, os rendimentos entretanto tinham caído drasticamente e muitos proprietários de vinhas tinham ficado financeiramente arruinados. Os vestígios de antigos socalcos que nunca foram replantados após a filoxera ainda hoje podem ser vistos em muitas partes da região.

Na década de 1880 o comércio de vinho do Porto começou a recuperar e os proprietários de vinhas enveredaram pela reconstrução e replantio das vinhas degradadas, a qual muitas vezes introduziu novas técnicas e novas castas. Nos finais do século XIX, o vinho do Porto tinha prosperado mais uma vez e teve um saudável nível de consumo até à década de 1920. Muitos dos costumes e rituais em torno do vinho do Porto Vintage datam deste período e isso fez com que o vinho do Porto Vintage adquirisse uma mística própria apenas dos mais prestigiados vinhos do mundo. Novos mercados começaram-se a desenvolver nos Países Baixos e na Escandinávia. Num clima de prosperidade, muitas casas produtoras de vinho do Porto investiram fortemente nas suas emblemáticas quintas para garantir a qualidade e a continuidade do estilo dos seus vinhos do Porto Vintage.

Em 1933, o Instituto do Vinho do Porto (IVP) foi criado pelo governo português para regular a produção e venda de vinho do Porto. Para o efeito, o IVP levou a cabo um método complexo e sofisticado de classificação das vinhas do Porto, para além de ter introduzido o controlo sobre a quantidade e a qualidade da sua produção.

Durante a 2ª Guerra Mundial, as vendas de vinho do Porto caíram acentuadamente, mas nas últimas décadas do século XX assistiu-se a um regresso ao crescimento. Esta foi uma era de inovação no comércio de vinho do Porto. Novos produtos e estilos de vinho foram desenvolvidos, tais como o célebre lote de reserva da Fonseca, o Bin No.27. O consumo de vinho do Porto tornou-se mais difundido geograficamente com mercados como os Estados Unidos e o Canadá, os quais foram mercados-chave para o vinho do Porto de qualidade nos anos finais do século. O investimento operado pelas casas produtoras de vinho do Porto nas suas vinhas incentivou o surgimento de novos métodos de vinificação e de sistematização da vinha, bem como novas investigações sobre o comportamento e as características das castas tradicionais de vinho do Porto. No fim do século, muitas vinhas foram convertidas em "Vinha ao Alto", ou seja, o plantio das videiras em linhas que correm verticalmente pelas encostas, uma técnica com muitas qualidades e muitos benefícios ambientais.

Os primeiros anos do século XXI testemunharam um investimento contínuo na vinha, com a sustentabilidade, tanto económica como ambiental, tornando-se uma prioridade cada vez mais importante para aqueles produtores que procuram preservar o património e o ambiente único da região do Douro para as gerações futuras.

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